Entrevista – Dr. Devanir Silva – Superintendente Geral da Abrapp

  1. Quais os maiores desafios observados pela ABRAPP para as EFPCs em 2022?

    Em uma conjuntura que combina alta inflação, juros subindo, baixo crescimento
    econômico, enfraquecimento das cadeias de suprimentos e guerra no leste europeu, o
    ambiente que se tem é claramente desafiador, mas é preciso também olhar para o outro
    lado. A própria economia brasileira emite sinais, ainda que modestos, de recuperação.
    Além disso, é preciso confiar na resiliência de nossa vertente de previdência
    complementar, que oferece seguidos exemplos da melhor gestão.
    Temos políticas de investimentos consistentes com foco no longo prazo e não em crises
    que com o tempo serão superadas. Por exemplo, até o meio do ano passado os fundos
    de pensão brasileiros enfrentavam e venciam o clima que já insinuava uma maior
    volatilidade, mas com o agravamento do quadro geral encerraram 2021 com déficit
    líquido de R$ 36 bilhões. Mas bastaram os primeiros meses de 2022 para que esse
    resultado negativo já fosse revertido em cerca de R$ 5 bilhões, em um sinal claro de
    recuperação.
    Antes disso, em 2020, ano do grande choque com a chegada da pandemia, já havíamos
    vivido situação similar, passando de um déficit de R$ 54 bilhões para um superávit de R$
    8 bilhões.
    E sem esquecer das demais provas da solidez das nossas entidades, que entregaram uma
    rentabilidade de 1019 % nos últimos 9 anos, contra 806% da taxa atuarial requerida para
    cobertura dos compromissos do passivo. E, mais importante, todos os anos paga
    regularmente perto de R$ 80 bilhões em benefícios previdenciários a um contingente que
    se aproxima de 1 milhão de brasileiros. É importante lembrar que o valor médio da
    aposentadoria paga é de R$ 6.621,00.
    Um sistema desses sabe e vai crescer. Conta para isso com alternativas como os planos
    instituídos, os voltados para os familiares de participantes e os que já começam a receber
    os servidores públicos dos entes federativos.

  2. Quais as expectativas para o segundo semestre de 2022?

    A nossa expectativa, embora com cautela, é positiva, levando em conta não apenas a
    recuperação da conjuntura, mas especialmente o que as nossas entidades têm de
    melhor, a começar da gestão qualificada, dos dirigentes certificados para as funções que
    exercem, da rigorosa aplicação de controles e de uma governança transparente.
    Os fundos de pensão fazem historicamente seus maiores investimentos em renda fixa,
    cujo retorno vem sendo mais elevados especialmente no atual quadro. Ademais, a
    inflação tenderá a cair no segundo semestre, melhorando com isso o ambiente
    macroeconômico, com mais que prováveis reflexos positivos na Bolsa e reforço na
    tendência de elevação das vendas no varejo. É possível ainda antever que a elevação dos
    preços internacionais das commodities trará consequências favoráveis para o Brasil.
    A segunda metade do ano também deve trazer para os fundos de pensão avanços
    normativos, ao autorizar investimentos para o fomento (marketing, entre outros) da
    entidade, regulamentar o uso do CNPJ por plano (assim oferecendo maior segurança
    jurídica) e um aprimoramento efetivo nas regras que regem os investimentos. A Abrapp
    vem mantendo com o Governo um intenso diálogo, fundamentado em muito
    aprofundamento técnico.

  3. Que lições a pandemia vai deixar para a economia?

    Provavelmente a primeira e principal lição é a do quanto é importante poupar, enfim, se
    preparar através do consumo consciente para períodos especialmente marcados pela
    incerteza. Quando isso ficou mais claro, logo no início da pandemia, falou-se muito na
    “poupança do medo”. Pois bem, o desafio enfrentado desde então é transformá-la em
    “poupança da esperança”, um ato consciente fundado na plena compreensão de que o
    futuro, naturalmente incerto, sempre exige que ajamos assim.
    Os dois últimos anos também ensinaram solidariedade. E nesse ponto somos levados a
    refletir sobre como planos de previdência complementar são ferramentas para sermos
    solidários em meio à nossa comunidade.
    Outros ensinamentos foram a importância de vencermos as distâncias – que cresceram
    no período com as restrições às aglomerações – investindo na comunicação, na
    tecnologia e na abertura para o novo, a disrupção. Mergulhamos em um mundo de
    inovações, onde se exige novas formas de pensar. Algo desafiante a que as nossas
    entidades, aliás, têm sabido muito bem responder, com novos produtos e novas formas
    de fazer.

  4. Quais foram os principais impactos da pandemia no setor de previdência privada
    observados pela ABRAPP?


    Impactos existiram, mas foram enfrentados e vencidos, deixando lições que reforçam o
    sentimento de confiança na capacidade que temos de superar obstáculos. Enfim,
    ultrapassar desafios contando com conhecimento técnico e diálogo com os Poderes
    Constituídos.
    É muito comum que em momentos de crise a depreciação de ativos e vendas para honrar
    compromissos. Felizmente, as nossas entidades não precisaram apelar para tal
    expediente, se descapitalizando durante a pandemia. Ao contrário, se capitalizaram
    comprando mais barato o que outros estavam vendendo. E mesmo assim não deixaram
    em nenhum momento de pagar regularmente os benefícios previdenciários a quase 1
    milhão de brasileiros.
    Enfim, um conjunto de fatores que nos permitem olhar focar em políticas duradouras de
    longo prazo. Em resumo, desligar-se um pouco da foto para se concentrar no filme
    inteiro.

  5. Para o senhor, houve alguma mudança no comportamento das pessoas com
    relação à previdência privada?


    Mais que nunca aflorou o sentimento do coletivo, a consciência de que atuando juntos –
    como fazemos ao participar de fundos de pensão – enfrentamos de forma muito mais
    efetiva os desafios da vida.
    Mudou também, é claro, a forma das pessoas verem a poupança, agora compreendida
    como fundamental para fazer frente às incertezas do futuro. Se havia alguma dúvida a
    esse respeito, o fato é que a perda repentina da renda na pandemia foi algo dramático
    que deixou essa verdade ainda mais evidente.
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